“Coisas”, de Moacir Santos, é um capítulo à parte na história da música brasileira. O título, simples e originalíssimo, representa bem o conjunto de músicas que compõem o álbum: dez peças musicais de extrema beleza e originalidade, tudo isso sem perder a singeleza. Sem dúvida, este álbum é um dos trabalhos mais importantes para a evolução da nossa música, sobretudo para a música instrumental, por toda a contribuição que deu a esta em termos de inovação, elaboração e beleza.
Ao ouvir “Coisas”, a impressão que se tem é que o disco foi lançado num dia desses, tamanha a sua modernidade e atemporalidade. Em tudo, o álbum é extremamente moderno: nos temas, nos arranjos, na escolha de timbres e naipes, enfim, um álbum perfeito e magistral.
Comprova esta impressionante modernidade o fato de todas as dez coisas terem sido regravadas em 2001, com os mesmos arranjos e instrumentações originais, num disco duplo em homenagem ao maestro (que ainda era vivo) intitulado “Ouro Negro”.
Lançado em 1965, “Coisas” é o primeiro álbum autoral do maestro Moacir Santos, que trabalhou durante quase duas décadas na Rádio Nacional, onde era o único maestro negro e, provavelmente, o mais original de todos. Antes de “Coisas”, além dos trabalhos na rádio como compositor e arranjador, Moacir trabalhou como compositor de trilhas em diversos filmes (como Ganga Zumba, Seara Vermelha, Os Fuzis etc.) e como arranjador em diversos álbuns, sobretudo nas décadas de 1950 e 1960, sendo dessa maneira, um dos músicos mais importantes para a renovação da música brasileira nesse período.
Moacir Santos é um verdadeiro inventor musical, um maestro no sentido etimológico da palavra, professor de outros mestres da música brasileira, como Baden Powell, Dori Caymmi, Paulo Moura, Chiquito Braga, Roberto Menescal entre outros grandes nomes da MPB. O maestro faz parte de um “grupo” de músicos imprescindíveis para a renovação da música brasileira – cada qual à sua maneira e com sua musicalidade –, como Tom Jobim, Radamés Gnatalli, Luiz Bonfá e João Gilberto.
Mas Moacir é um caso à parte, já que foi o único que resgatou um tipo de música que estava relegado nessa época: a música afro-latina, que ele conseguiu, genialmente, amalgamar a outras influências, como o jazz, a música nordestina e a música erudita, formando um estilo de música impossível de classificar, rico, vigoroso e extremamente influente.
E é esta grande música, esta grande arte deste genial artista que se pode apreciar em “Coisas”, um álbum essencial na história da música brasileira.
(Denisson Ventura)
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